Tenho saudades do escudo. Saudades de quando as empresas têxteis estavam em dificuldades e graças às desvalorizações até com os chineses eram capazes de concorrer. Saudades do tempo em que a inflação tinha dois dígitos e o primeiro era o dois. De quando não havia problemas orçamentais, nunca faltava dinheiro ao Estado, o único problemazito era a balança comercial.
Era um tempo simpático, se a coisa dava para o torto na balança comercial, acordávamos uma desvalorização, coisa que nem ocupava o tempo do café em discussão, a indústria passava logo a ser competitiva e o nosso dinheiro, mesmo desvalorizado, ainda valia mais do que o dólar. E ninguém se queixava dos impostos, não havia evasão fiscal nem devedores ao fisco em listas na Internet. Nem havia internet, só inventada muito mais tarde graças ao Simplex.
Com a inflação nos dois dígitos e idem nos aumentos, apertávamos o cinto mas tínhamos a sensação de nadar em dinheiro. Andávamos felizes, se os trabalhadores faziam greves era mais a pensar na revolução do que na devolução do que tinham perdido, os sindicatos iam de vitória em vitória.
Agora é uma seca, para as empresas ganharem produtividade temos que apertar o cinto, se não pagam impostos temos que apertar o cinto, se o Estado gasta em excesso temos que apertar o cinto. A política económica já não tem graça, não passa da escolha adequada do buraco do cinto mais adequado às circunstâncias. Até as notas de escudo eram mais simpáticas, das mais bonitas do mundo e nem se desfaziam como os euros da Alemanha. Tenho saudades do escudo, era cada vez mais pobre mas ao menos empobrecia feliz e sem dar por isso.
1 comentário:
Olha também eu tenho saudades e os nossos não se desfazem como na Alemanha mas desaparecem do bolso com uma facilidade enorme...
Enviar um comentário